terça-feira, 29 de novembro de 2011

Ao meu amigo

Escrevo notas,
digo adeus: vou fugir.
Preciso fugir para os sítios brancos,
para as áreas puras
do frio purificador.
Urgentemente desejo
a saída,
num acto cobarde
e catártico
que me devolva o que tinha dentro.
Vou correr para fora de mim
encontrar no meu reflexo
unidades emocionais perdidas
e desfazer abraços que me estrangulam
e sorrisos que me cortam
e ser inteira e só,
unicamente, simplesmente,
finalmente.

Quando me encontrar, digo-te.
Escrevo-te uma carta. Ou um bilhete, talvez.
Mas vou precisar que saibas tudo:
que me encontrei, que quero que o saibas,
por seres a consciência que não fala,
mas que ouve,
a que não concorda, me insulta
e me acarinha quando tudo cai.

Quando todo este tempo-tornado terminar,
eu falo-te;
quando terminar
e eu cessar de ser eu,
agradeço-te.

Quando tudo isto chegar ao fim,
dar-te-ei a saber que te amo.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Intervalo

Olho o sol e atento os intervalos
de luz.
Noção vaga e curta do que é "quase-ser",
de não ficar para trás, mas de lado.
Que doença grande
esta deste não contentamento,
deste desalento. Deste sofrimento, talvez.

Porque dói entender que não se fez tudo?
O que dói, no fundo?
A sensação na cabeça... o pensamento que me mói
e me engana, provavelmente.
Que foi que fiz? Que provas julguei ter ultrapassado,
quantas missões julgarei ter completado?
Que foi que fiz?

Quanta vontade de dormir e ninguém me deixa.
Cerro os olhos e há alarmes
e eu acordo sempre por entre as minhas lágrimas,
julgando-me já purificada.
Mas sinto o peito magoado
e sinto a vida em mim dormente.
Num puro momento anestésico, firo-me,
que, sentir por não sentir, que haja rastos
daquilo que me feriu e não senti.

Vejo as mãos ressequidas
por um passado presente.
Cada vez mais gélida, ninguém me sofre.
Cada vez mais rouca e só.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Quando

Quando tudo o resto falhar,
não olhes para trás.
Chora. Explode.
Bate contra coisas,
mas não olhes para trás.
Não te rendas,
o passado exige-to.

Quando tudo se arruinar,
perde todas as noções,
todas as regras que te impedem
de seres tu;
improvisa
e solta relâmpagos,
para que ninguém se aproxime
e todos vejam, finalmente,
toda a luz que irradia de ti!

Quando tudo se desmoronar,
não sofras... não adiantará,
que enquanto sofres o que foi, o que será
terá fugido; não saibas.
Não queiras.
Pratica o esquecimento e relembra
as coisas todas anteriores,
superiores,
sublimes momentos longe.
Esquece e anda em frente.

Quando se for,
agradece teres vivido
todo o tempo concedido.
Mas não saibas. Esquece.
Não olhes para trás.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Sentimento de Gerúndio

Eles vão ficando...
embora chorando
e implorando
para que se desvaneçam
e desapareçam
do meu mundo triste e escuro,
eles vão ficando...

Vão-me quebrando
e lentamente tomando
o sangue, a alma,
a alegria ou a calma...

Permanecem gritando
mudos, murmúrio brando,
na insanidade ou na loucura
com que de mim me vão roubando!...

E vou caindo, vou chorando...
crendo que ando voando
e por outras vidas me maravilhando...

Vou brincando que nada existe!...

Vou tentando
alcançar o espelho que, girando,
se afasta de mim, troçando.

Vejo-me longe, vagueando...
pálida, desacreditando
nos contos e nas fadas que me vão contando.

Sinto-me por dentro despedaçando,
débil e morta, ansiando
a ponte para o outro lado...

Tão impossível e apartado...

[Agosto 2008]

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Ajuda-me!

Ajuda-me.
Esquece as minhas lágrimas,
olha só para trás e dá-me a mão.
Dá-me só a mão!
Sinto falta de carícias.
Sinto um estranhamento dentro.

Olha para trás, ajuda-me,
mas esquece as minhas costas
e cega do teu olhar
todas as marcas de todas as chagas que não fecharam.
Não te assustes. Ajuda-me,
que a vontade de não querer cresce
e me assusta a mim mesma por instantes,
me faz temer o que eu própria não conheço!

Dá-me a mão, lembra os salmos
e ignora por completo os meu pecados,
que agora nada sou.
Nada ficou dos pedaços
que vão ficando espalhados pelo chão.

Deixa-me gritar... não ouças.
Deixa-me soluçar, chorar e não sonhar mais,
que eu não posso mais,
não suporto mais,
que me enoja muito mais
tudo o que sinto.

Dá-me a mão, mas não me vejas...
Agarra-me, impede-me de cair, mas não queiras
nunca que teus olhos encontrem os meus.
Não queiras nunca curar
as feridas que todos julgam sarar.
A dor dessas feridas a doer.

domingo, 6 de novembro de 2011

Certidão

Jogos de escadas e vácuos.
Vórtices incalculáveis.

Aragens.

Veículos de castidade
maculada por tempo.
E o tempo é tudo.

Onde era a minha casa?
Saber o caminho de volta...
Sonhos, males meus
de não reconhecer os teus
suspiros por um mim diferente.
Agora, poente o momento,
sangrando no mar.

Agora, onde foste?
Jogos de espelhos foscos
que não deixam ver destinos.
O tempo é tudo?
É.
Foste.

Encontrar a certa contaminação,
o certo caminho esquecido,
a certa castidade
maculada por desgosto.
E saber-te de novo.
Vórtices incalculáveis de mágoa,
de mim.

Escadas e vácuos
e vazios e tristeza.

Agonias de ter caído
ao transbordar de mim.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Abismo

Na hipótese de abismo
atiro-me sem pensar,
porque tenho, no fundo,
a coragem p'ra me atirar.
Na primeira hipótese de abismo,
atiro-me.
Saudades de sentir um vento frio,
um sussurro gélido,
um impulso qualquer que me devolva
a identidade;
sabes? Saudade de mim.
Passa tanto tempo para o tempo se mover...
É bom saber que os vácuos persistem,
que ainda há fantasmas e bruxas que assistem
a todos os meus espasmos.
Alguém ainda me vê as convulsões.

As novas coisas, sensações
febris,
anemias de carências, fiz
do medo um novo lugar.
No próximo abismo, vou saltar.
Porque não?
há teias para me parar, há as redes das razões,
há os princípios, as convenções,
há de tudo um pouco para me envenenar
contra as minhas próprias invenções!...
Mas a minha cabeça arde...
nas vertigens e nos turbilhões
há o grito que me rasga
e me fere em perturbações...

Eu quero saltar porque não tenho asas nos pés.
A gravidade do mundo e das coisas sérias...
E os desejos? As estrelas?
Onde voltar a vê-las neste poço que findou de vez?

Não me importa que não queiram que salte.
No próximo abismo, salto com coragem
e faço-me engolida na voragem
do que fui...

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

O mundo muda mudo.
O mundo se transfigura
e eu, sugada por tudo.

porque as cores são fusões
de estados em várias fases;
as cores são trovões;

os olhos não sabem conhecer
a velocidade das alterações...
dói (re)aprender.

Tocam-me. É sem cura
que todas as metades
sejam o todo que transfigura.

Tudo é a dor que me perfura.
Essa dor, essa, que perdura.

Essa, que me estilhaça a sanidade.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

23 de Setembro de 2010

Rasga-me as chagas!
Espanca-me feridas!
Grita-me, revolta-me,
enoja-me a visão das coisas!

Fere-me por dentro
para que volte a chorar...

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Evasão

As horas passam e os lados das paredes que constroem o aqui tornam-se em bocas gigantes e bocejantes. Quero outro aqui ou um ali mais próximo, fresco e azul. Quero Creta e ver as coisas e falar às coisas e respirar as coisas que cantam certamente tão alto. Que as coisas falam connosco e, às vezes, falam tão alto que são óperas de Anjos a cantar! E vaguear pelas ruas de Lá e ouvir o mar que fala diferente, melodicamente aos ouvidos... Pisar a areia de Lá, as outras cores do Mundo e do Mar de sereias cheio... de sereias cheio, certamente!...
As horas passeiam com os lados das paredes que constroem o limite temporal que não me deixa sair daqui...

[31 de Março de 2011]

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Silêncio, as gotas da chuva

Silêncio, as gotas da chuva.
Risos de não querer saber,
de não esperar, de conter
o silêncio, as gotas da chuva.

Ruas passadas a ferro,
a ferro, a fumo, a quente,
a quente, queimando no ardente,
das ruas passadas a ferro.

Estradas vagueantes e erro,
erro de esperança, de sonho, de venturas...
erro de serem erro o sonho e as ternuras...
Estradas distantes passadas a ferro.

Silêncio, as gotas da chuva.
O sol de fora ardendo quente...
Tudo passado a fumo, a decadente...
As gotas da chuva passadas a ferro.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Eu tinha uma casa
bem no meio do mar.
Eu tenho horas, horas
que gasto a chorar.

Eu tenho versos guardados
dos poemas que não escrevi
e tenho dos sonhos sonhados
as saudades que tive daqui.

Guardo num baú antigo,
coberto de resina e pós,
as canções que ecoam comigo,
outro som ou outra voz

do outro vidro embaciado,
envelhecido pelo tempo,
eu vejo minh' alegria, meu grão contado
p'lo amigo que guardo no vento.

E é na gravidade, esse marulho,
tempo pleno de infinito,
que findo e mergulho
e me engulo em meu próprio grito.

domingo, 30 de janeiro de 2011

1989 Revisited

Hoje, talvez seja um texto por terminar...
talvez, hoje, um tratado de Paz por anunciar,
um "cessar fogo" tão urgente quanto a respiração;
um suspiro limpo, um fôlego brando,
uma confiança plena numa sensação de quietude;
um som de armas caindo,
de mãos que se apertam,
de olhares que se cruzam, que se vêem,
que se mostram pela primeira vez;
uma virgindade de cheiros e carícias,
um "eu amo-te!" sincero e para todos
porque é urgente amar todos;
uma sensação de calor, de aconchego,
de tranquilidade, de colo de Mãe,
de um medo que não existe já;
uma antes magnitude caída,
uma parede em Berlim, reerguida e vencida,
um orgulho em não ter de sentir jamais orgulho;

um sonho, aqui;

Hoje, uma frescura em saber que brotam flores do meu cabelo.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Memories

"I'm trying to survive
in this dark endless night..
Maybe painting the sky of gold
will remind me of your brightest light...
This mindless words
are like falling birds
into this kingdom of loneliness;
You know you're the one who can make me escape
from this hell full of emptiness...!

Cause you're the one who takes the pain away,
I'm screaming on the silence
just to hear the things I'll never say
Don´t leave me dying
away from paradise,
don't look at me with your
shinny green eyes..."

in "Pain Away"
by ragb

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Cristalizações

Tenho vidros no estômago
que me sangra por dentro.

Vidros, cacos, agonias.

Facas que me trincham levianamente,
e uma dor que me corta,
que fere,
que esbanja sangue por mim.

Vidros de sonhos quebrados,
ecos por escutar.
Vidros, talvez, acabados
de nascer p'ra me cortar...

Talvez, vidros e vitrinas,
cenários, purpurinas,
tédios e outros sinais...

Murmúrios, fantoches, crinas,
o chão torto, as escadas, as esquinas...
minha alma esquartejada nas catedrais.

Meu sangue exposto, cor fúnebre nos monumentos, nos vitrais...