sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Medo

Os meus medos são poucos. Não há que temer.
Há apenas que ter bom senso, calma e, principalmente, perspicácia.
Olho aberto, em linguagem corrente. 

Eu tenho medo. Dói-me a alma de pensar que posso um dia enfrentar o medo.
Ou os medos. Já que tantos são. E são tantos.

O meu maior medo é aquele que não vejo, que sinto e me apavora por dentro. Que decora os meus passos para me poder perseguir. O que não me deixa dormir ou fechar os olhos nem por um instante. O que me mente dizendo-se distante. Que se apodera da minha mente e me grita mudo constantemente. Me sufoca o corpo, me tira o ar, e aperta a garganta sem que possa respirar. o fantasma que me segue e me assombra, que se cola a mim e me toma a sombra. Meu medo é o medo que segreda ao meu ouvido, que me ameaça em tom de voz sumido. Que me sente quente e me esfria. Que me encarna a alma e deixa totalmente vazia.

terça-feira, 27 de março de 2012

Breve Passagem

A vida é uma sucessão de boas passagens: seria tão bom poder encará-la como uma outra viagem qualquer em que preparamos a bagagem (ou não) e se parte. Seria realmente bom ter memória saudavelmente, sem mágoas nem rancores, e atribuir importância apenas ao que nos deu, de uma forma ou de outra, um momento de felicidade.

Há pessoas que me recordam que a minha vida é uma passagem. Há pessoas especiais. Na minha passagem. E como lhes agradeço sem que saibam o seu tão grande contributo para a minha memória saudável, porque ver as pessoas especiais me faz consciencializar do meu tamanho e ver-me, na minha verdadeira medida, acalma-me. As pessoas especiais tiram-me o medo. O medo que, há demasiado tempo, tem habitado em mim.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Ao meu amigo

Escrevo notas,
digo adeus: vou fugir.
Preciso fugir para os sítios brancos,
para as áreas puras
do frio purificador.
Urgentemente desejo
a saída,
num acto cobarde
e catártico
que me devolva o que tinha dentro.
Vou correr para fora de mim
encontrar no meu reflexo
unidades emocionais perdidas
e desfazer abraços que me estrangulam
e sorrisos que me cortam
e ser inteira e só,
unicamente, simplesmente,
finalmente.

Quando me encontrar, digo-te.
Escrevo-te uma carta. Ou um bilhete, talvez.
Mas vou precisar que saibas tudo:
que me encontrei, que quero que o saibas,
por seres a consciência que não fala,
mas que ouve,
a que não concorda, me insulta
e me acarinha quando tudo cai.

Quando todo este tempo-tornado terminar,
eu falo-te;
quando terminar
e eu cessar de ser eu,
agradeço-te.

Quando tudo isto chegar ao fim,
dar-te-ei a saber que te amo.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Intervalo

Olho o sol e atento os intervalos
de luz.
Noção vaga e curta do que é "quase-ser",
de não ficar para trás, mas de lado.
Que doença grande
esta deste não contentamento,
deste desalento. Deste sofrimento, talvez.

Porque dói entender que não se fez tudo?
O que dói, no fundo?
A sensação na cabeça... o pensamento que me mói
e me engana, provavelmente.
Que foi que fiz? Que provas julguei ter ultrapassado,
quantas missões julgarei ter completado?
Que foi que fiz?

Quanta vontade de dormir e ninguém me deixa.
Cerro os olhos e há alarmes
e eu acordo sempre por entre as minhas lágrimas,
julgando-me já purificada.
Mas sinto o peito magoado
e sinto a vida em mim dormente.
Num puro momento anestésico, firo-me,
que, sentir por não sentir, que haja rastos
daquilo que me feriu e não senti.

Vejo as mãos ressequidas
por um passado presente.
Cada vez mais gélida, ninguém me sofre.
Cada vez mais rouca e só.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Quando

Quando tudo o resto falhar,
não olhes para trás.
Chora. Explode.
Bate contra coisas,
mas não olhes para trás.
Não te rendas,
o passado exige-to.

Quando tudo se arruinar,
perde todas as noções,
todas as regras que te impedem
de seres tu;
improvisa
e solta relâmpagos,
para que ninguém se aproxime
e todos vejam, finalmente,
toda a luz que irradia de ti!

Quando tudo se desmoronar,
não sofras... não adiantará,
que enquanto sofres o que foi, o que será
terá fugido; não saibas.
Não queiras.
Pratica o esquecimento e relembra
as coisas todas anteriores,
superiores,
sublimes momentos longe.
Esquece e anda em frente.

Quando se for,
agradece teres vivido
todo o tempo concedido.
Mas não saibas. Esquece.
Não olhes para trás.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Sentimento de Gerúndio

Eles vão ficando...
embora chorando
e implorando
para que se desvaneçam
e desapareçam
do meu mundo triste e escuro,
eles vão ficando...

Vão-me quebrando
e lentamente tomando
o sangue, a alma,
a alegria ou a calma...

Permanecem gritando
mudos, murmúrio brando,
na insanidade ou na loucura
com que de mim me vão roubando!...

E vou caindo, vou chorando...
crendo que ando voando
e por outras vidas me maravilhando...

Vou brincando que nada existe!...

Vou tentando
alcançar o espelho que, girando,
se afasta de mim, troçando.

Vejo-me longe, vagueando...
pálida, desacreditando
nos contos e nas fadas que me vão contando.

Sinto-me por dentro despedaçando,
débil e morta, ansiando
a ponte para o outro lado...

Tão impossível e apartado...

[Agosto 2008]

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Ajuda-me!

Ajuda-me.
Esquece as minhas lágrimas,
olha só para trás e dá-me a mão.
Dá-me só a mão!
Sinto falta de carícias.
Sinto um estranhamento dentro.

Olha para trás, ajuda-me,
mas esquece as minhas costas
e cega do teu olhar
todas as marcas de todas as chagas que não fecharam.
Não te assustes. Ajuda-me,
que a vontade de não querer cresce
e me assusta a mim mesma por instantes,
me faz temer o que eu própria não conheço!

Dá-me a mão, lembra os salmos
e ignora por completo os meu pecados,
que agora nada sou.
Nada ficou dos pedaços
que vão ficando espalhados pelo chão.

Deixa-me gritar... não ouças.
Deixa-me soluçar, chorar e não sonhar mais,
que eu não posso mais,
não suporto mais,
que me enoja muito mais
tudo o que sinto.

Dá-me a mão, mas não me vejas...
Agarra-me, impede-me de cair, mas não queiras
nunca que teus olhos encontrem os meus.
Não queiras nunca curar
as feridas que todos julgam sarar.
A dor dessas feridas a doer.